sábado, 27 de abril de 2013

Diante da Fifa e da CBF, dá para torcer pelo Brasil na Copa?

O presidente da Fifa, o suíço Joseph Blatter, e o secretário-geral da entidade, o francês Jérôme Valcke, deixaram claro, durante um evento em Zurique na quarta-feira 24, que tipo de organização comandam. A Fifa é um organismo internacional incrivelmente poderoso, cuja forma de atuar, truculenta e autoritária, só faz fomentar a indignação entre analistas e torcedores. Em vez de levar alegria para os países-sede da Copa do Mundo, um dos auges do esporte mundial, a Fifa tem apenas provocado desilusões.

Em Zurique, a Fifa organizou um raro evento edificante. A intenção era discutir quais os impactos da Copa do Mundo para os países que organizam o torneio. Blatter, com a desfaçatez que lhe é peculiar, mostrou a importância que dá à democracia. Segundo ele, ficou feliz com o título da Argentina em 1978, pois “houve uma reconciliação do povo com o sistema político militar da época”. Para deixar claro, o que Blatter revelou foi sua satisfação com o fato de o torneio (que ele ajudou a organizar) ter contribuído para diminuir a pressão popular sobre o governo do ditador criminoso Jorge Rafael Videla.

Valcke foi além. “Vou dizer algo que é maluco, mas menos democracia às vezes é melhor para se organizar uma Copa do Mundo. Quando você tem um chefe de estado forte, que pode decidir, assim como [Vladimir] Putin poderá ser em 2018, é mais fácil para nós organizadores do que um país como a Alemanha, onde você precisa negociar em diferentes níveis”. Nesta quinta-feira 25, Valcke foi ao Twitter para dizer que foi mal interpretado. Estaria o francês fazendo apenas uma constatação.

De fato, a constatação de Valcke é verdadeira. Sistemas autoritários têm facilidade até para mudar o caráter de um país; realizar um evento como a Copa do Mundo, portanto, é algo até certo ponto tranquilo. O que falta na declaração de Valcke é uma autocrítica da Fifa, uma tentativa da entidade de responder: qual Copa do Mundo estamos levando para as sedes e como isso afeta esses países?

A resposta deveria ter surgido em Zurique, mas não há, no comportamento da Fifa, qualquer indício de reflexão deste tipo. A Fifa está interessada apenas em lucrar (com isenção total de impostos) e gerar lucro a seus patrocinadores, os mesmos que, ao juntar suas marcas à Copa do Mundo, financiam a ditadura Blatter-Valcke dentro da Fifa e outras menores nas federações regionais e locais. O que a Fifa deseja é trabalhar com países que espelhem seu funcionamento: um pequeno grupo fechado controla tudo, e fica com os dividendos, enquanto a negociação se resume a detalhes.

Como foi na África do Sul, em que pequenos negócios não puderam funcionar nas cercanias do estádio, um restaurante foi fechado por exibir uma bola de futebol na janela e até agências de viagem foram processadas, no Brasil a Fifa tem provocado apenas ódio com suas determinações absurdas. A última delas está no site da Tribuna da Bahia nesta quinta-feira 25. Segundo a Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo (Sucom) de Salvador, as festas de São João em junho, quando ocorre a Copa das Confederações, foram proibidas na capital baiana por conta de uma ordem da Fifa. É difícil pensar em uma exigência mais descabida que essa, mas não se pode duvidar da Fifa. Também em Salvador, a entidade tenta proibir a venda de acarajés, patrimônio imaterial nacional, nas cercanias dos estádios.

No Brasil, o desgosto provocado pela Fifa é potencializado. Em seu últimos três anos, o ex-presidente Lula (PT) pouquíssimo fez pela organização do torneio a não ser manobrar para que seu time, o Corinthians, conseguisse construir um estádio. O ônus ficou para o governo Dilma Rousseff (PT), que corre contra o tempo para preparar os puxadinhos dos aeroportos. As administrações municipais, tradicionalmente incompetentes, não promoveram grandes mudanças em nenhuma das cidades-sede, e alguns dos estádios, distribuídos por conveniência política, se tornarão elefantes brancos em questão de meses.

Soma-se a isso o fardo que é para o torcedor brasileiro ter de aguentar a seleção brasileira, cada vez mais sem coração e chamada por muitos de “seleção da CBF” (a Confederação Brasileira de Futebol), presidida por José Maria Marin, o capacho da ditadura, por sua vez sucessor de Ricardo Teixeira, exilado em Miami após as várias denúncias contra ele.

O torcedor brasileiro tem diante de si a seguinte situação: um poder público omisso e submisso à Fifa, uma Copa do Mundo cujos benefícios são impossíveis de enxergar, e uma seleção sem qualquer caráter. Torcer contra parece ser, cada vez mais, uma opção viável.

José Antonio Lima (http://www.cartacapital.com.br)

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